“Não me ponha cueca velha para sair”, cansara-se de ouvir da mãe desde pequeno. Ainda assim, nunca mudara o hábito: as cuecas velhas, diga-se, davam-lhe uma aprazível sensação de liberdade. De fato, gostava tanto que nem sequer fazia distinção entre os dias, pois usá-las no domingo ou na segunda, fosse dia de descanso, fosse dia de aula, dava no mesmo. Com efeito, manteve o costume até o dia em que noivou. A mãe mudou um pouquinho só o aviso: “Não me ponha cueca velha para se encontrar com a sua futura mulher.” Silvério, entretanto, continuou dando de ombros, até o dia que a mãe asseverou: “Ainda vai se arrepender.”
A tragédia anunciada: não reparou o carro que avançou o semáforo. Rolou sobre o capô e, passando por todas as variáveis de um conjunto infinito de probabilidades, teve somente a calça rasgada pelo ferro da antena. Quando caiu no chão atrás do Opala, estava apenas de camiseta e — quem diria, senão a própria mãe de Silvério — de cueca furada.
Estampou a capa do jornal. O editor teve o cuidado de cobri-lo com uma tarja preta, mas a história correu mesmo assim. Narrada pelos presentes no dia, o ponto alto concentrava-se no furo; era no furo que estava cinquenta por cento daquilo que o definia como homem. “Cinquenta por cento, redondo”, diziam. “No duro?”, alguns perguntavam. “No mole”, respondiam outros no escracho.
Para Jacira, a noiva, foi uma vergonha sem precedentes. “Não me caso mais! Não com um sujeito que anda com a cueca furada”, bateu o pé, decidida, atordoada, arrependida. Diriam, até, intimamente ferida.
“Uma freada, vai lá”, disse o pai. “Para uma freada tem remédio. Pode-se culpar um medo súbito, uma indigestão, até mesmo um falso gás. Mas para cueca furada…”
“Não há desculpa mesmo não”, complementou a mãe da noiva, enquanto costurava o fundilho das ceroulas do marido.
O casamento foi desfeito. Para Jacira, cuecas em bom estado virou pré-requisito. Afugentou, inclusive, diversos pretendentes. Perguntava, sem preâmbulos: “Tem cueca furada na gaveta?” Os sinceros, motivados pelo idílio e boa-fé, eram logo descartados. Os demais, logo desconfiavam de certo grau de loucura. Mas Jacira encontrou, ainda assim, um homem ousado e de roupas finas que quase se ofendeu com a pergunta. “Olhe bem para mim. Acha mesmo que tenho roupas furadas?”
Virou noiva outra vez. O rapaz a apresentou para a família durante um jantar. Jacira sentiu certo desgosto ou náusea por parte da sogra. “Essa vai ser abacaxi”, pensou. Ao final, urdiu com o futuro marido: “Sua mãe estava assim e assim comigo. Não gostei.” E ele: “Acontece, amor, que mamãe não gostou do seu vestido furado na axila.”
Desfez o casamento e pensou: “Silvério é o homem ideal.”
Até encontrá-lo novamente e perguntar: “Ainda tem cueca furada na gaveta?”
Gustavo Scussel